quarta-feira, 2 de junho de 2010

PRAÇA


         Lugar melhor que praça não há. Claro, não posso generalizar, nem me esquecer que para cada ambiente, construção, existe uma temática, um cálculo, uma lógica, um olhar. Mas em meu quesito particular elas são uma delícia, basta ser praça. Aqui as pessoas se encontram, abraçam, trocam uma ou outra informação, um segredo, distraem-se, sentam nos bancos e esquecem da vida.                                  

        Neste exato momento sou a única pessoa sentada aqui a desfrutar de sua paz, seu refúgio. O céu que cobre esta parte é mais azul. E as nuvens trazidas pelo vento, ao passarem por aqui querem se demorar mais um pouco. Vão chegando lindas, fofas, brancas e charmosas e logo são tantas que o espaço aberto e largo do céu fica apertado. Abro um sorriso e entendo que estão se distraindo, talvez descansando de sua interminável viagem, ou se despedindo, já que daqui a pouco vão chover em algum lugar por aí.

         Os raios do sol  douram as árvores plantadas por alguma mão abençoada. Por um momento, até o vento se torna mais lento. Outras pessoas vão se chegando, procuram uma sombra para se refrescar do calor. Algumas crianças trouxeram uma bola de plástico e rolam ali na grama confortável. Uma menina é atraída por minha concentração e se aproxima para ver o que faço. Coloca-se entre a cadeira que peguei emprestada em um bar e a árvore atrás de mim. Quer me ver trabalhar. Se estivéssemos em uma cidade maior e ela se aproximasse assim, já encher-me-ia de desconfiança. E no caso de  a cronista ser  paranóica, certamente recolheria seu material e iria embora dali.

          As praças de cidades do interior nos permitem não desconfiar de ninguém.  Divago sobre estas impressões humanas quando sinto o vento soprar mais forte. Sua conversa com o sol terminou e, agora, acalenta as árvores que se sacodem. Em um segundo o céu esta limpo de novo. As nuvens já vão longe e ouço seus risinhos sapecas e felizes. Logo, estou sozinha de novo. Sem crianças, sem bola, sem nuvens. Esse é o ciclo eterno de toda praça. Ora cheia de gente. Ora cheia de solidão.

         Contudo, sem nunca perder a graça. De dia é linda e a noite freqüentada. Seus bancos são cúmplices de amores e desamores; confidências, tapas e beijos; afetos e desafetos. E, como em toda praça, estão sempre ávidos por visitantes. Esses são amigos, fiéis amigos. Ensinam a seus filhos a visitarem-na e ela eterniza-se a cada nova geração.

         Outra nuvem chegou e tapou o sol. As árvores e flores balançam alegres com a presença do amigo vento. Eu vou me demorar por aqui mais um pouco. Quem sabe eles, a praça e o vento, se esqueçam de minha presença e compartilhem algum segredo.  Mais tarde quando o sol se por, cobrirá a praça com raios dourados e a lembrará que a lua está chegando. É hora de novas histórias presenciar

       Vida de praça é assim mesmo, porque lugar melhor que praça não há.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

DIA DE INDIO



         Senti um arrepio na espinha quando a professora Delice cantou e as crianças começaram a pular. Neste dia do índio elas usam colares de continhas e cocar fabricados por suas pequenas mãos. Os cocares feitos com penas de galinhas, caídas nos quintais de suas mães.

         Os alunos estão animados. Brincam, de índio caracterizados, na queimada da educação física curricular. E nesses momentos, Delice é mais que uma professora, é uma amiga que brinca. De fora do campo, e entrosada com a turma torce pelos dois times. Ela mesma, várias vezes, se pondo a pular.

         Isso me apaixona, esse amor da professora que transcende ao rigor dos livros. Em minha opinião o ensino deve ser assim mesmo, como o despertar de uma paixão. O aprender está mais para brincadeira, assim é fácil fixar. As coisas mais gostosas da vida eu aprendi  brincando. E brincava de tudo quanto há. Peteca, bandeirinha. Brincava até de contar. Era no pique - esconde, contava para o tempo passar, os colegas esconderem e eu ia procurar.

         Ouço gritos na quadra, uma menina foi queimada e os cocares balançam nas cabecinhas agitadas. Os rostos estão afogueados e  Delice, do outro lado tem instruções a passar. Eu de cá, sinto falta de algo que não existe mais. Tempo passado, mas tempo não volta atrás. E os gritos dos alunos empolgados a cada amigo queimado quase me fazem chorar.

         A brincadeira acabou o dia do índio findou, mas as lembranças os acompanharão  por onde eles passarem. Crianças seguem sorrindo. Arcos, flechas, cocar.